O Antigo Testamento descreve a iniciativa divina na expiação como fundamental e singular, contrastando com as práticas religiosas das nações vizinhas. Em vez de ser uma resposta humana a uma divindade ofendida ou uma tentativa de manipular forças espirituais, a expiação no Antigo Testamento é primariamente uma provisão e instrução de Deus para o seu povo.
Desde o início da história bíblica, após a queda do homem, a necessidade de expiação é apresentada, e a iniciativa para lidar com o pecado vem de Deus. Embora Caim e Abel ofereçam sacrifícios, o próprio Deus estabelece o significado e a forma aceitável de aproximação. No contexto do êxodo do Egito, Deus ordena a instituição da Páscoa, onde o sangue do cordeiro é o sinal da proteção divina contra o juízo. A instrução específica para este ato salvífico demonstra a iniciativa de Deus em prover um meio de escapar da condenação. O Senhor declara: “Vendo eu sangue, passarei por cima de vós”.
A outorga da Lei Mosaica no Sinai é um marco crucial na revelação da iniciativa divina na expiação. Deus não apenas revela seus padrões de santidade, mas também institui um sistema detalhado de sacrifícios e ofertas para a expiação dos pecados. O livro de Levítico, em particular, detalha as diversas ofertas pelo pecado, as ofertas pacíficas e outras formas de sacrifícios, todos prescritos por Deus como o caminho para a reconciliação e a manutenção da comunhão com Ele. A própria linguagem da “aliança ou testamento” usada para descrever o relacionamento de Deus com seu povo é tirada do Antigo Testamento, onde o conceito de aliança é central. Essas alianças são iniciativas divinas para trazer o povo a uma comunhão comprometida com Ele.
É importante notar que, no Antigo Testamento, a expiação através do sacrifício não depende da invenção humana. Em contraste com as tentativas em outras culturas de apaziguar deuses através de oferendas arbitrárias ou autoflagelação, o Deus de Israel fala e especifica como o seu povo deve se aproximar d’Ele. Ele toma a iniciativa de providenciar a maneira pela qual a reconciliação será efetuada. Os sacrifícios não eram primariamente atos de gratidão ou tentativas de manipulação divina, mas sim meios divinamente ordenados para lidar com a culpa e a transgressão. Deus determinou especificamente que os animais usados como ofertas fossem sem defeito e oferecidos voluntariamente, simbolizando a troca de uma vida inocente pela culpada através do derramamento de sangue.
A centralidade do sangue na expiação é repetidamente enfatizada, culminando na declaração de Levítico 17:11: “Porque a alma da carne está no sangue, pelo que vo-lo tenho dado sobre o altar, para fazer expiação pela vossa alma, porquanto é o sangue que fará expiação pela alma”. Essa passagem revela que foi Deus quem proveu o sangue como o meio de expiação. O ato sacrificial, portanto, é uma resposta obediente à iniciativa divina.
O Dia da Expiação (Yom Kippur) é um exemplo máximo da iniciativa de Deus na expiação. Deus estabeleceu este dia específico e os rituais detalhados que o sumo sacerdote deveria seguir para fazer expiação pelos pecados de toda a nação. A entrada do sumo sacerdote no Santo dos Santos com o sangue do sacrifício, uma vez por ano, era um ato ordenado por Deus para manter a propiciação. Contudo, a repetição anual deste ritual também apontava para a insuficiência final desses sacrifícios para remover completamente o pecado, preparando o caminho para a promessa de uma expiação definitiva.
O Antigo Testamento apresenta, portanto, um Deus que não é indiferente ao pecado e à separação que ele causa. Sua paixão pela santidade e sua justiça exigem uma resposta ao pecado. No entanto, em sua misericórdia e amor, Deus toma a iniciativa de prover o meio pelo qual essa justiça pode ser satisfeita e a comunhão restaurada. A promessa de esperança no Antigo Testamento reside precisamente nessa iniciativa divina, que culmina na promessa de um Redentor que resolveria o “enigma” de como Deus pode ser justo e, ao mesmo tempo, justificador. A resposta a esse enigma é revelada no Novo Testamento em Jesus Cristo, o sacrifício perfeito providenciado por Deus para a expiação dos pecados da humanidade. O sistema sacrificial do Antigo Testamento, em sua totalidade, aponta para essa iniciativa final e completa de Deus em Cristo.