Tanto o pensamento gnóstico quanto o movimento montanista se diferenciaram significativamente das correntes ortodoxas da igreja primitiva em relação ao papel das mulheres, cada um à sua maneira e por razões distintas.
No gnosticismo, a diferença residia principalmente na sua teologia e na inclusão de um princípio feminino no divino. Diferentemente da teologia ortodoxa emergente, que enfatizava uma estrutura divina primariamente masculina (Deus Pai), algumas correntes gnósticas incorporavam uma compreensão do divino que incluía um elemento feminino. Este princípio feminino era expresso de várias formas e sob diferentes nomes, como “Mãe”, “Som”, “Pensamento do Pai” e outros. A presença e a importância deste princípio feminino na sua cosmologia inevitavelmente elevavam a consciência feminina dentro das suas comunidades.
Apesar desta valorização teológica do feminino, algumas visões gnósticas apresentavam uma perspectiva curiosa sobre o papel das mulheres na salvação. Textos gnósticos sugeriam que, para que as mulheres entrassem no reino dos céus, elas deveriam de alguma forma “tornar-se homens”. Esta ideia, exemplificada na fala atribuída a Jesus no Evangelho de Tomé (“Toda mulher que se tornar homem entrará no reino dos céus”) e na interpretação de Irineu sobre as discussões gnósticas sobre o elemento feminino em Bythus (o ser supremo gnóstico), reflete uma complexidade nas visões gnósticas sobre gênero e espiritualidade. Enquanto o feminino era reconhecido no divino, havia também a sugestão de que a plena realização espiritual para as mulheres poderia envolver uma espécie de assimilação ao masculino.
Além disso, as seitas gnósticas frequentemente atribuíam seus ensinamentos a figuras femininas ou alegavam ter recebido revelações através delas. Por exemplo, os naasenos afirmavam ter recebido seus ensinamentos através de uma mulher chamada Marianne, que teria sido mediadora de Tiago, irmão de Jesus. Os nicolaítas também atribuíam uma obra a uma mulher que acreditavam ser a esposa de Noé, chamada Noria. A literatura apócrifa gnóstica nomeava várias mulheres como profetisas, como Tecla e Marianne. Esta proeminência de mulheres em papéis de transmissão de conhecimento e autoridade espiritual contrastava com a crescente cautela e restrição dos papéis de liderança feminina nas correntes ortodoxas.
O montanismo, por outro lado, diferenciou-se da ortodoxia através da sua ênfase na profecia e numa nova ordem espiritual que incluía mulheres em papéis proféticos de destaque. Fundado por Montano, o movimento ganhou força com a participação ativa de duas profetisas, Maximila e Priscila. Estas mulheres não eram figuras marginais, mas centrais para a identidade e a mensagem do montanismo. Elas proclamavam o retorno iminente de Cristo e o advento da Nova Jerusalém, falando em nome de Deus. Maximila chegou a declarar que depois dela não haveria mais profetisa, marcando a sua importância e a urgência da sua mensagem.
A ortodoxia emergente via com suspeita o movimento montanista e, em particular, o papel proeminente das mulheres como profetisas e líderes. Uma das acusações contra Maximila e Priscila era que elas haviam deixado seus maridos para seguir Montanus, o que desafiava as normas sociais e eclesiásticas da época. A igreja ortodoxa, que estava a consolidar a sua estrutura e a definir os papéis de liderança, mostrava-se cada vez mais relutante em aceitar a autoridade profética independente, especialmente quando exercida por mulheres. Embora os pronunciamentos das profetisas montanistas não negassem diretamente a doutrina básica, a sua autoridade como novas fontes de revelação e a sua independência em relação à hierarquia eclesiástica estabelecida eram vistas como problemáticas e uma ameaça à unidade e à ordem da igreja.
A diferença fundamental entre o montanismo e a ortodoxia em relação às mulheres residia na aceitação da sua autoridade profética e do seu papel de liderança espiritual fora das estruturas estabelecidas. Enquanto a ortodoxia primitiva reconhecia o dom da profecia e havia exemplos de mulheres profetisas (como as filhas de Filipe), o montanismo elevou a profecia feminina a um nível de autoridade que competia com a liderança masculina estabelecida e introduzia novas ênfases e expectativas para a igreja.
Em contraste, a corrente ortodoxa da igreja, embora inicialmente tivesse mulheres em papéis significativos como testemunhas, líderes de igrejas domésticas, diaconisas e professoras, começou a restringir cada vez mais os seus papéis públicos de liderança e ensino, possivelmente influenciada por normas sociais greco-romanas e preocupações sobre a ordem e a imagem da igreja. As ordens eclesiásticas posteriores refletem essa tendência de limitar o ministério feminino à esfera privada e de evitar que as mulheres ensinassem ou exercessem autoridade sobre os homens em assembleias mistas.
Assim, enquanto o gnosticismo oferecia uma valorização teológica do princípio feminino e permitia que mulheres fossem figuras de autoridade espiritual e revelação, e o montanismo abraçava a liderança profética feminina com grande destaque, a igreja ortodoxa primitiva, embora inicialmente com uma participação feminina ativa, moveu-se gradualmente para restringir os papéis públicos das mulheres, uma trajetória que contrastava com a maior liberdade e autoridade concedidas às mulheres dentro dos grupos gnósticos e montanistas.