O Antigo Testamento aponta para Cristo de maneiras diversas e profundas, sendo essa a principal mensagem que Jesus e os escritores do Novo Testamento enfatizaram. O Antigo Testamento não é meramente uma coleção de histórias antigas ou lições morais isoladas, mas sim a narrativa da promessa de Deus e a preparação para a vinda de seu Filho, Jesus Cristo.
Mark Dever, no livro “A Mensagem do Antigo Testamento”, explora essa relação através de três caminhos principais, que não são exclusivos, mas oferecem perspectivas distintas sobre a unidade das Escrituras.
Primeiramente, o Antigo Testamento aponta para Cristo através de seus temas teológicos centrais. Ao isolar o tema principal de cada livro do Antigo Testamento, podemos observar como esses temas encontram sua explicação e cumprimento no evangelho de Cristo. Em vez de começarmos perguntando o que uma passagem do Antigo Testamento nos diz sobre nós, a pergunta primordial deve ser: como essa passagem testifica de Cristo?. Apenas Jesus Cristo, que cumpre o Antigo Testamento, define a vida do cristão. Se o Antigo Testamento não apontar para Cristo, também não aponta de forma autêntica para o cristão. Nosso crescimento cristão se dá ao nos tornarmos mais parecidos com Cristo, e os heróis do Antigo Testamento servem de exemplo apenas na medida em que prenunciam e apontam para Ele.
Em segundo lugar, a relação entre o Antigo e o Novo Testamento se revela através das alusões e citações do Antigo Testamento presentes no Novo Testamento. Estima-se que o Novo Testamento faça cerca de 1,6 mil dessas referências. Com exceção talvez de 2 e 3 João, todos os livros do Novo Testamento estabelecem essas conexões, que são majoritariamente teológicas e não apenas analógicas. Os autores do Novo Testamento, incluindo o próprio Jesus, interpretaram as Escrituras do Antigo Testamento como profecias e prefigurações da vinda e da obra de Cristo. Jesus disse que Moisés escreveu sobre Ele. Ele também afirmou que Abraão se alegrou por ver o seu dia. Após a ressurreição, Jesus explicou aos seus discípulos, começando por Moisés e todos os profetas, o que dEle se achava em todas as Escrituras.
O terceiro método para entender como o Antigo Testamento aponta para Cristo é a tipologia. A tipologia se baseia no fato de que Deus revelou seus propósitos salvadores progressivamente ao longo das Escrituras. Tudo o que Deus disse e fez na história de Israel preparou o caminho para a vinda do Messias, Jesus Cristo. Essa preparação se dá especificamente pela prefiguração da verdade que seria totalmente revelada em Jesus. Por exemplo, a libertação de Israel do Egito pela Páscoa, com o sangue do cordeiro protegendo os primogênitos da ira de Deus, prefigura a libertação do pecado e da morte através do sangue de Cristo, o Cordeiro de Deus. Paulo declara que “Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por nós”.
O Antigo Testamento está repleto de promessas que encontram seu cumprimento em Cristo. O povo de Deus esperava o profeta prometido a Moisés (Dt 18.15-19), um rei (Is 9.6; 11.1-5) e, possivelmente, um servo sofredor (Is 53). Eles aguardavam a vinda do Filho do Homem sobre as nuvens, conforme a visão de Daniel (Dn 7.13). O Novo Testamento registra a história do cumprimento perfeito dessas promessas na vida, morte e ressurreição de Jesus de Nazaré. Jesus Cristo é, portanto, a essência da Bíblia, pois trata de sua totalidade. O Antigo Testamento fez promessas sobre Cristo, e o Novo Testamento as cumpre Nele.
Um aspecto central de como o Antigo Testamento aponta para Cristo é a questão do pecado e da expiação. O Antigo Testamento revela a paixão de Deus pela santidade e sua justa ira contra o pecado. O sistema de sacrifícios no Antigo Testamento, embora não removessem a culpa de forma definitiva sem a graça de Deus, servia para ilustrar a seriedade do pecado e a necessidade de um sacrifício para a expiação. O Dia da Expiação (Levítico 16) apontava para a necessidade de um sacrifício perfeito para os pecados de toda a nação. O “enigma” do Antigo Testamento, como Deus pode ser misericordioso e justo ao mesmo tempo (Êx 34.6-7), encontra sua resolução na obra de Cristo. Jesus, como nosso Sumo Sacerdote e Mediador, oferece o sacrifício final que satisfaz as justas exigências de Deus e possibilita o perdão para aqueles que se arrependem e confiam Nele. Ele sofreu a punição devida ao pecador, tornando-se nosso substituto.
A promessa de esperança no Antigo Testamento também está intrinsecamente ligada à vinda de Cristo. Apesar do pecado e do fracasso do povo de Israel, Deus sempre prometeu e planejou revelar sua glória. A esperança não residia na história do povo ou no sistema sacrificial em si, mas na pessoa prometida, o Messias. A forma como Jesus veio surpreendeu muitos, pois Ele se apresentou não apenas como o cumprimento das promessas de um Messias real, mas também como o servo sofredor do Senhor que se sacrificaria por seu povo.
Compreender o Antigo Testamento é, portanto, crucial para entender o Novo. Ele fornece o contexto para a compreensão da pessoa e da obra de Cristo. A criação, a queda, a eleição de Israel, a lei, a história do povo de Deus – tudo isso prepara o cenário para a vinda de Cristo. As parábolas de Jesus, suas disputas com os fariseus e as epístolas do Novo Testamento frequentemente se fundamentam no Antigo Testamento. Ignorar o Antigo Testamento limita nossa capacidade de entender a revelação de Jesus Cristo.
Em resumo, o Antigo Testamento aponta para Cristo através de seus temas teológicos, das citações e alusões no Novo Testamento, da tipologia, das promessas messiânicas, da revelação da necessidade de expiação para o pecado e da promessa de esperança centrada na vinda do Messias. Jesus Cristo é a chave que destranca o significado do Antigo Testamento. Ao estudar o Antigo Testamento com essa perspectiva cristocêntrica, somos levados a uma compreensão mais profunda da grandiosidade da obra de Deus, da magnificência de seu plano e da tenacidade de seu amor.