William Carey exerceu uma influência profunda e multifacetada que o consagrou como o “Pai das Missões Protestantes Modernas”. Sua atuação não apenas inaugurou uma nova era no empreendimento missionário protestante, particularmente entre os falantes da língua inglesa, mas também estabeleceu um legado duradouro que continua a moldar a compreensão e a prática da missão cristã até os dias atuais.
A influência de Carey pode ser rastreada a partir de sua convicção inabalável sobre a obrigatoriedade da Grande Comissão. Em uma época em que muitos cristãos acreditavam que a conversão dos povos não alcançados era uma prerrogativa exclusiva de Deus, a ser realizada no tempo e à maneira divinos, Carey argumentou veementemente que o mandamento de Cristo para “ir por todo o mundo e pregar o evangelho a toda criatura” (Marcos 16:15) ainda era vinculativo para todos os crentes e, especialmente, para os ministros do Evangelho. Essa convicção culminou na publicação, em 1792, de sua obra seminal “An Enquiry into the Obligations of Christians, to use means for the Conversion of the Heathens”. Este livro não apenas refutou as objeções teológicas e práticas à missão, mas também apresentou um plano concreto para a evangelização mundial, fundamentado em uma pesquisa abrangente do estado religioso e geográfico das diferentes nações. A “Enquiry” serviu como um manifesto para o movimento missionário protestante, estimulando a reflexão sobre a responsabilidade dos cristãos em levar o Evangelho aos confins da terra.
O impacto imediato da “Enquiry” e da paixão de Carey foi a fundação da Sociedade Missionária Batista Particular em outubro de 1792. Carey desempenhou um papel central nesse processo, culminando em seu famoso sermão de 1792, baseado em Isaías 54:2, 3, no qual exclamou: “Esperem grandes coisas! Tentem grandes coisas!”. Essa frase, embora posteriormente adaptada, capturou a visão ousada e a expectativa de Carey em relação ao poder de Deus para transformar vidas e nações. A fundação da BMS abriu caminho para o surgimento de inúmeras outras agências missionárias na Inglaterra, na Europa continental e na América do Norte, marcando o início de um século XIX que se tornou conhecido como o “Grande Século das Missões”.
A decisão de Carey de ir para a Índia em 1793, apesar de inúmeros obstáculos pessoais, financeiros e legais, serviu como um catalisador poderoso para o movimento missionário. Sua perseverança diante de adversidades extremas – incluindo a perda de um filho, a instabilidade mental de sua primeira esposa, dificuldades financeiras e a oposição da Companhia Britânica das Índias Orientais – demonstrou um compromisso inabalável com sua vocação missionária. Sua vida na Índia, que se estendeu por quase 41 anos sem jamais retornar para uma licença, exemplificou a dedicação e o sacrifício exigidos daqueles que se aventuravam a levar o Evangelho a terras distantes.
A obra de tradução da Bíblia realizada por Carey e sua equipe em Serampore constituiu uma contribuição monumental para o movimento missionário. Apesar de sua educação formal limitada, Carey demonstrou uma notável aptidão para línguas, aprendendo diversas por conta própria. Ele liderou o esforço para traduzir a Bíblia completa para seis línguas indianas (Bengali, Oriya, Marathi, Hindi, Assamese e Sanskrit) e porções para outras 29 línguas e dialetos. Essa dedicação em disponibilizar as Escrituras na língua vernácula foi fundamental para o crescimento do cristianismo na Índia, pois permitiu que os convertidos tivessem acesso direto à Palavra de Deus. Embora algumas avaliações posteriores criticassem a qualidade de certas traduções, o volume e a abrangência do trabalho de Carey estabeleceram um precedente para a tradução bíblica como um componente essencial da missão cristã.
Além da tradução, Carey e seus colegas reconheceram a importância da educação na propagação do Evangelho. Eles fundaram escolas para meninos e meninas, ensinando uma variedade de disciplinas, incluindo estudos bíblicos, ciência e matemática. Em 1818, eles estabeleceram o Serampore College, a primeira instituição cristã de ensino superior na Ásia, com o objetivo de formar líderes indianos para a igreja, independentemente de casta ou denominação. Essa iniciativa pioneira destacou a visão de Carey de uma missão holística que abordasse não apenas as necessidades espirituais, mas também as intelectuais e sociais das comunidades locais.
Carey também demonstrou uma profunda preocupação com as questões sociais e lutou contra práticas prejudiciais prevalecentes na Índia de sua época, como o infanticídio e o sati (a queima de viúvas). Ele protestou veementemente contra essas atrocidades, pressionando o governo britânico a intervir e promulgar leis para sua abolição. Sua atuação nesse campo reflete sua crença de que a mensagem cristã tinha implicações não apenas para a salvação individual, mas também para a transformação das estruturas sociais injustas.
A influência de Carey se estendeu além de seu próprio trabalho direto na Índia. Sua vida e seus escritos inspiraram inúmeros outros a se dedicarem à missão transcultural. Missionários como Adoniram e Ann Judson, pioneiros no trabalho missionário no Sudeste Asiático, foram influenciados pelo exemplo de Carey. O movimento missionário que ele desencadeou no século XIX transformou radicalmente o panorama do cristianismo mundial, levando a um crescimento significativo da igreja em regiões como Ásia, África e América Latina.
Em seus últimos anos, apesar de suas conquistas notáveis, Carey manteve uma profunda humildade, considerando-se um “verme pobre e desamparado” dependente da graça divina. Essa perspectiva humilde, juntamente com sua perseverança inabalável e sua paixão pela glória de Deus, solidificou seu legado como um dos mais importantes e influentes pioneiros do movimento missionário protestante. Sua visão de “esperar grandes coisas e tentar grandes coisas” continua a inspirar e desafiar os cristãos a se engajarem na obra da missão global.
