A geografia do Antigo Testamento, centrada no deserto e nas terras férteis do Crescente Fértil, é radicalmente diferente do cenário do Novo Testamento. O apóstolo Paulo não viajou pelo deserto, mas navegou pelos mares, impulsionando a expansão do cristianismo através das rotas comerciais do Império Romano. Este novo contexto, moldado por impérios pagãos como os de Alexandre, o Grande, e os Romanos, preparou o terreno para a disseminação do evangelho.
Para compreender a fundo o Novo Testamento, é crucial analisar o mundo no qual a igreja primitiva floresceu. Este artigo explora o panorama político e cultural que os primeiros cristãos enfrentaram, elucidando a importância de uma tradução bíblica específica, a Septuaginta, como ferramenta vital para o evangelismo primitivo.
A Transição do Antigo para o Novo Testamento
No Antigo Testamento, o deserto desempenha um papel central. Figuras como Abraão, Moisés e Elias encontram-se frequentemente no deserto, um local de provação e revelação. A água é vista como um bem precioso, simbolizando a vida e a renovação espiritual. O Crescente Fértil, que se estende da Mesopotâmia ao Egito, é o palco da maioria dos eventos bíblicos.
Em contraste, o Novo Testamento apresenta um cenário diferente. Jesus nasceu dentro do mundo do Antigo Testamento, com os magos do oriente e a fuga para o Egito ecoando narrativas antigas. No entanto, a missão de Paulo transforma o cenário, levando o evangelho para além das fronteiras tradicionais.
O Novo Mundo de Paulo: Navegação e Comércio
Paulo, natural de Tarso (atual Turquia), embarcou em navios e viajou pelo Mediterrâneo. Diferente das jornadas terrestres do Antigo Testamento, a sua missão dependia das rotas marítimas e dos portos comerciais do Império Romano. Ele navegou em direção ao oeste, rumo à Europa, evitando notavelmente o Egito, um centro populoso judaico, mas, de alguma forma, ausente em suas missões. As razões por trás dessa escolha permanecem um tema de especulação, influenciadas pelas condições e circunstâncias da época.
O Legado dos Impérios na Expansão do Evangelho
No final do Antigo Testamento, o Oriente Médio era dominado por uma sucessão de impérios, incluindo os Assírios, Babilônios e Persas. O livro de Daniel profetiza a ascensão e queda desses impérios. A língua aramaica, utilizada pelos Assírios e Persas, tornou-se a língua comum do Oriente Médio, influenciando a cultura e a comunicação da região.
A Influência de Alexandre, o Grande
A invasão de Alexandre, o Grande, marcou uma mudança significativa no Oriente Médio. Alexandre, da Macedônia, conquistou o Império Persa, expandindo a influência grega por toda a região. Fundou Alexandria no Egito, que se tornou um centro de cultura e comércio. Após a sua morte, o seu império foi dividido entre os seus generais, com Ptolomeu a governar o Egito e Seleuco a Síria e a Mesopotâmia.
A imigração judaica para Alexandria durante o domínio dos Ptolomeus resultou numa comunidade judaica significativa na cidade. No entanto, esses judeus assimilaram a cultura grega, incluindo a língua. Ao contrário dos judeus da Palestina, que mantiveram a sua identidade étnica e cultural, os judeus da diáspora adotaram o grego como sua língua principal. Essa assimilação cultural levou à necessidade de uma tradução das escrituras judaicas para o grego.
A Septuaginta: Uma Ferramenta de Evangelismo
Por volta de duzentos anos antes de Cristo, a Septuaginta (LXX), uma versão grega do Antigo Testamento hebraico, foi produzida. Esta tradução foi crucial para a disseminação do judaísmo e, posteriormente, do cristianismo no mundo de língua grega. A Septuaginta permitiu que gentios conhecessem as escrituras judaicas e se convertessem ao judaísmo, tornando-se “tementes a Deus”.
O judaísmo palestino, centrado na Galileia e Judeia, manteve-se mais tradicional, enquanto o judaísmo da diáspora floresceu em cidades gregas. A língua grega, disseminada por Alexandre, tornou-se a língua da administração e do comércio no Mediterrâneo Oriental.
A Palestina no Tempo de Jesus: Um Mosaico Cultural
A Palestina na época de Jesus era um mosaico cultural, com o aramaico sendo a língua comum e o grego sendo utilizado em contextos administrativos e comerciais. Alguns estudiosos questionam se Jesus e os seus discípulos conheciam o grego. Embora o conhecimento formal do grego possa ter sido limitado, é provável que Jesus e os seus discípulos tivessem alguma compreensão da língua, devido à sua presença na vida cotidiana.
O Domínio Romano e a Expansão do Cristianismo
Por volta de duzentos anos antes de Cristo, os Selêucidas da Síria derrotaram os Ptolomeus e assumiram o controle da Palestina. As tentativas de impor a cultura grega aos judeus levaram a uma revolta, resultando na independência da Judeia por cerca de cem anos. No entanto, a ascensão do Império Romano mudou o cenário político.
No ano sessenta e três antes de Cristo, os Romanos, liderados por Pompeu, conquistaram a Síria e a Palestina. Inicialmente, mantiveram o sumo sacerdote no poder, mas posteriormente nomearam Herodes como rei da Judeia em quarenta antes de Cristo. Após a morte de Herodes, os Romanos integraram a Judeia ao Império Romano, nomeando um governador, como Pôncio Pilatos.
A Administração Romana e a Diversidade Cultural
O Império Romano era caracterizado pela diversidade e pela administração indireta. As províncias eram governadas de acordo com os seus próprios tratados e acordos com Roma. Essa diversidade cultural e administrativa teve um impacto significativo na forma como o cristianismo se espalhou pelo império.
A língua latina, embora utilizada para fins oficiais, não penetrou profundamente no Mediterrâneo Oriental. O grego continuou a ser a língua da comunicação e da administração na região. No entanto, no Mediterrâneo Ocidental, a colonização romana resultou na disseminação da língua latina, dando origem às línguas românicas modernas.
O Exército Romano: Pilar da Unidade Imperial
O Império Romano era mantido unido pela força militar. O exército romano era uma instituição altamente eficiente que preservava a unidade do império. No entanto, a crescente influência dos militares na política romana levou a instabilidade e à ascensão de líderes militares como Júlio César.
As estradas romanas, construídas para fins militares, facilitaram a comunicação e o comércio em todo o império. O exército romano expandiu-se para o norte da Europa até a fronteira do Reno e do Danúbio, seguindo a região do vinho e do azeite. O vinho e o azeite, elementos básicos da dieta mediterrânea, desempenharam um papel importante na cultura e na religião da região.
Vinho e Azeite: Símbolos Culturais e Religiosos
Na Bíblia, o azeite é utilizado para unção e cura, enquanto o vinho é utilizado para a comunhão. Esses elementos tornaram-se símbolos sagrados no cristianismo, mesmo em regiões onde não eram produtos básicos. No norte da Europa, o vinho precisava ser importado, tornando-se um símbolo especial e sagrado.
Conclusão: O Contexto Histórico do Novo Testamento
Para compreender plenamente a expansão do cristianismo, é essencial analisar o contexto histórico e cultural do Império Romano. A influência da língua grega, a disseminação da cultura romana e a diversidade administrativa do império criaram um ambiente propício para a disseminação do evangelho. A jornada de Paulo pelo Mediterrâneo, utilizando as rotas comerciais romanas, exemplifica como o império facilitou a expansão do cristianismo para além das fronteiras da Palestina.
Bibliografia Recomendada:
Igreja: um Relato Teológico e Histórico de Gerald Bray