De acordo com os excertos da obra “Teologia do Novo Testamento”, o perdão ocupa um lugar central e inovador no ensino e ministério de Jesus, estando intrinsecamente ligado à sua proclamação do Reino de Deus.
- Autoridade para Perdoar Pecados: Um ponto crucial é que Jesus reivindicou ter autoridade para perdoar pecados. Este ato foi considerado blasfêmia pelos escribas, pois, em sua compreensão, somente Deus possuía tal prerrogativa. Marcos relata que o conflito entre Jesus e os escribas começou justamente quando Jesus declarou ter poder para perdoar pecados (Mc. 2:7). Jesus demonstrou essa autoridade curando o paralítico como prova de que “o Filho do Homem tem na terra poder para perdoar pecados” (Mc. 2:10).
- Perdão na Era Messiânica: Segundo os profetas do Antigo Testamento, o perdão seria uma das bênçãos características da era messiânica. Jesus, ao oferecer e conceder perdão, estava, portanto, cumprindo essas promessas proféticas e sinalizando a chegada do Reino de Deus.
- Nova Experiência de Perdão: Jesus não apenas ensinou uma nova doutrina sobre o perdão, mas trouxe aos pecadores perdidos uma nova experiência de perdão. Ele pronunciava o perdão de forma direta e taxativa, como fez com a mulher na casa de Simão: “Os teus pecados te são perdoados” (Lc. 7:48). Esta declaração era a própria “salvação” dela, indicando que o perdão não era meramente uma possibilidade futura, mas uma realidade presente através de Jesus.
- O Reino como Dom Presente: A presença do Reino de Deus na pessoa de Jesus permitiu que as pessoas tivessem como experiência presente aquilo que os profetas prometeram para o Reino escatológico, incluindo o perdão. Jesus não prometeu o perdão, ele o conferiu.
- Relação entre Perdão Humano e Divino: A centralidade do perdão no conceito do Reino é ilustrada na parábola do perdão (Mt. 18:23-35), que demonstra a relação intrínseca entre o perdão divino e o humano. O perdão de Deus precede e condiciona a obrigação moral humana de perdoar. Aqueles que experimentam o perdão gratuito de Deus devem manifestar um espírito perdoador.
- Justiça e Perdão: A justiça, no ensino de Jesus, está intimamente relacionada ao perdão. Não é primariamente uma qualidade ética, mas sim um relacionamento correto e a absolvição divina da culpa do pecado. Buscar o Reino implica buscar a justiça de Deus, que acompanha o recebimento do Reino. A parábola do publicano que foi justificado por Deus (Lc. 18:14) ilustra que essa justiça é uma dádiva divina, similar à doutrina Paulina da justificação pela fé, embora sem menção explícita da cruz neste contexto dos Evangelhos Sinópticos.
- Perdão como Característica da Igreja/Discípulos: O perdão também é apresentado como uma marca distintiva da comunidade do Reino, a Igreja. Jesus enfatizou a importância do perdão e da humildade entre seus discípulos. A disposição de perdoar é uma evidência do amor e uma demonstração da vida característica do Reino. A autoridade para “ligar e desligar” (Mt. 16:19; 18:18) e perdoar ou reter pecados (Jo. 20:23) confiada aos discípulos não é arbitrária, mas representa o resultado inevitável do testemunho quanto ao Reino de Deus.
Em contraste com algumas perspectivas judaicas da época, onde o perdão dependia primariamente do arrependimento e das ações do pecador, Jesus enfatizou a iniciativa divina em buscar e salvar os perdidos. O Deus que Jesus apresenta é um Deus que busca pecadores e os convida ao Reino, onde o perdão é oferecido como um dom gratuito, precedendo e capacitando a resposta humana. Portanto, o perdão não é apenas um tema nos ensinamentos de Jesus, mas sim uma realidade central de sua missão e da inauguração do Reino de Deus.