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A visão missionária de William Carey passou por um desenvolvimento significativo ao longo de sua vida, desde as primeiras sementes de curiosidade e despertar espiritual até uma convicção inabalável que o impulsionou a se tornar o “Pai das Missões Modernas Protestantes”.

As raízes da imaginação de Carey podem ser rastreadas até sua infância no interior da Inglaterra. Embora sua família fosse “incomum” e sua educação básica, sua mente era fértil. Ele falava tanto de Cristóvão Colombo que seus amigos de infância o apelidaram com o nome do aventureiro. As histórias de seu tio Peter, um soldado que serviu no Canadá, sobre navios, mares e povos estrangeiros no Novo Mundo, também alimentaram sua imaginação. Essas primeiras exposições a terras distantes e culturas desconhecidas plantaram as sementes de um interesse que mais tarde se transformaria em uma paixão por missões.

Um ponto crucial no desenvolvimento de sua visão foi sua conversão. Criado em uma família anglicana, Carey admitiu ter sido “viciado em palavrões, mentiras e conversas impuras” até os 14 anos. Seu encontro com John Warr, um sapateiro aprendiz congregacionalista e um “Dissenter” devoto, marcou uma virada em sua vida espiritual. Apesar de inicialmente resistir às ideias de Warr, a consciência de Carey o convenceu de sua necessidade de um Salvador, levando-o a deixar a “morta e carnal” Igreja da Inglaterra. Sua nova fé apaixonada o levou a se preocupar com seus parentes anglicanos e a sentir um desejo de compartilhar suas convicções. Esse despertar espiritual inicial foi fundamental para moldar sua visão de mundo e seu senso de propósito.

Um evento específico que “engajou sua mente a pensar em missões” foi a leitura de “As Viagens do Capitão Cook”. As famosas jornadas do navegador pelos mares do Sul cativaram Carey e catapultaram sua imaginação para terras distantes e povos estrangeiros. Essa exposição geográfica e cultural despertou nele um interesse profundo pelas diferentes nações do mundo e, presumivelmente, pela sua situação espiritual.

Paralelamente ao seu interesse geográfico, Carey passou por um período de intenso estudo das Escrituras. Influenciado por um sermão de Andrew Fuller, um pregador batista local, ele iniciou uma “busca lenta e paciente das Escrituras”, que o convenceu a se submeter ao batismo e a se unir aos Batistas Particulares em 1783. Essa imersão na Bíblia fortaleceu sua compreensão da fé cristã e, crucialmente, começou a moldar sua visão sobre a responsabilidade dos crentes em relação ao mundo.

Acreditava-se que Carey havia começado a “esperar grandes coisas” como nunca antes após a leitura das viagens de Cook. Essa expectativa crescente se combinou com sua crescente convicção sobre a obrigação cristã de alcançar todas as nações. Em 1786, suas ideias sobre missões estavam suficientemente claras para que ele estivesse pronto para debatê-las. Ele sentia que seus colegas hipercalvinistas deixavam os seres humanos muito passivos em relação à salvação dos outros. Quando uma reunião da associação Batista buscou tópicos para discussão, Carey propôs sua crescente paixão: “Se o mandamento dado aos apóstolos para ensinar todas as nações não era obrigatório para todos os ministros sucessivos até o fim do mundo”. A resposta desanimadora que recebeu (“Jovem, sente-se, sente-se! Você é um entusiasta. Quando Deus quiser converter os pagãos, ele o fará sem consultar você ou eu. Além disso, deve haver outro dom pentecostal de línguas!”) não o dissuadiu, mas o moveu a estudar mais e a começar a escrever um livro.

O fruto dessa reflexão e estudo foi publicado em 1792: “Uma Investigação sobre as Obrigações dos Cristãos, de usar meios para a Conversão dos Pagãos”. Este livro, muitas vezes chamado de “a Magna Carta do movimento missionário protestante”, articulava de forma poderosa a visão de Carey sobre a contínua validade da Grande Comissão dada por Jesus aos seus discípulos (“Ide e fazei discípulos de todas as nações” – Mateus 28:19). Ele argumentava que essa ordem não era apenas para os apóstolos, mas para todos os cristãos. Em sua “Investigação”, Carey examinou o estado religioso das diferentes nações do mundo, o sucesso de empreendimentos missionários anteriores e a praticidade de iniciativas futuras. Ele respondeu vigorosamente às objeções dos hipercalvinistas e daqueles que levantavam obstáculos práticos às missões. Sua pesquisa detalhada, incluindo estimativas da população mundial e das proporções de “pagãos” e “maometanos”, demonstra sua crescente compreensão da escala da tarefa missionária.

A pregação de Carey no encontro de ministros batistas em maio de 1792, baseada em Isaías 54:2, 3 (“Amplia o lugar da tua tenda”), culminou em um chamado inesquecível: “Esperem grandes coisas! Tentem grandes coisas!”. Essa mensagem apaixonada, enraizada em sua convicção bíblica e em sua visão da necessidade global, finalmente prevaleceu. Em outubro de 1792, doze ministros formaram a Sociedade Missionária Batista “para a propagação do Evangelho entre os pagãos, de acordo com as recomendações da Investigação de Carey”.

A decisão de Carey de ir para a Índia em 1793, apesar de inúmeros obstáculos, incluindo a oposição de sua esposa e a falta de apoio financeiro e permissão da Companhia Britânica das Índias Orientais, demonstra a profundidade de sua visão missionária. Sua determinação em “nunca olhar para trás” diante de “problemas aparentemente insuperáveis” revela uma fé e uma convicção extraordinárias.

Os primeiros anos de Carey na Índia foram repletos de dificuldades e contratempos, incluindo pobreza, doença, a perda de um filho e a deterioração da saúde mental de sua esposa. No entanto, mesmo em meio a essas provações, ele persistiu em seus estudos de bengali, iniciou a tradução da Bíblia e pregou para pequenos grupos. Sua capacidade de “plodar” e “perseverar em qualquer busca definida” foi fundamental para manter sua visão viva em face de circunstâncias extremamente desafiadoras.

A chegada de William Ward e Joshua e Hannah Marshman em Serampore em 1799 marcou uma nova fase no desenvolvimento da visão missionária de Carey. A formação desse eficaz “trio de Serampore” permitiu uma expansão significativa do trabalho missionário, incluindo a criação de escolas, a fundação do Serampore College, o estabelecimento de uma imprensa para a impressão da Bíblia e outros materiais, e um envolvimento mais profundo com a cultura e a sociedade bengali. A visão de Carey de alcançar a Índia com o Evangelho se tornou uma realidade colaborativa, com cada membro do trio contribuindo com seus dons e habilidades únicos. Sua expectativa de “grandes coisas” se multiplicou com o sucesso crescente da missão.

O compromisso de Carey com a tradução da Bíblia para as línguas vernáculas da Índia, incluindo o bengali, o sânscrito e muitas outras, reflete sua crença de que as Escrituras deveriam ser acessíveis a todos no seu próprio idioma. Seu trabalho pioneiro nesse campo não apenas avançou a causa do Evangelho, mas também teve um impacto duradouro no desenvolvimento e na padronização dessas línguas.

Além da evangelização direta e da tradução da Bíblia, a visão missionária de Carey se estendeu à reforma social. Ele protestou veementemente contra práticas sociais prejudiciais como o infanticídio, o sati e a exposição de doentes e moribundos. Suas petições ao governo e a divulgação dessas questões contribuíram para mudanças legislativas significativas. Sua crença de que a mensagem cristã também se aplicava às estruturas sociais pecaminosas demonstra uma visão holística da missão.

Em seus últimos anos, Carey continuou a “esperar coisas ainda maiores”, propondo até mesmo uma conferência missionária mundial, uma ideia que estava 100 anos à frente de seu tempo. Sua perseverança inabalável, mesmo diante de reveses pessoais e profissionais, e seu foco constante na glória de Deus, conforme expresso em seu epitáfio (“Um verme miserável, pobre e desamparado, em Teus braços bondosos caio”), resumem a profunda e duradoura visão missionária que ele desenvolveu ao longo de sua vida. Sua vida e obra inspiraram inúmeras pessoas a seguir seus passos, marcando o século XIX como o “Grande Século das Missões”.

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